segunda-feira, 8 de dezembro de 2014

Ah, os intocáveis...

Há algumas semanas, tive uma conversa com uma querida colega jornalista a respeito de carreira, ou, melhor, dar um novo direcionamento a ela; fui eu que pedi para trocar umas ideias com ela, devido a esse período de transição em que estou vivendo já faz algum tempo. Ela me deu alguns ótimos toques e, entre eles, a indicação de um livro chamado "Lean In: Women, Work, and the Will to Lead", da chefe de operações do Facebook Sheryl Sandberg em parceria com um cara que eu me esqueci o nome. Aqui no Brasil o título é Faça acontecer - mulheres, trabalho e a vontade de liderar. Como o tema me interessa muito, finalmente adquiri o livro na semana passada e comecei a lê-lo hoje a caminho do trabalho. O tema é ótimo, a tradução é da sempre competente Denise Bottmann e, pelo jeito, a leitura vai me prender (que bom!). Ah, e o prefácio é da empresária Luiza Helena Trajano, presidente do Magazine Luiza. Afinal, nada mais justo a edição conter um texto de alguém com o perfil da Lu, oras!

[Abrindo parêntese: a primeira vez que eu vi uma loja do Magazine Luiza foi em 2004, lá em Botucatu, na época em que tentei cursar Agronomia na Unesp. Ainda não havia lojas da rede varejista aqui em São Paulo. Algum tempo depois, vi uma loja aqui e outra ali. Depois, quando eu comecei a trabalhar no Meio & Mensagem, revisava muitos textos a respeito do anunciante Magazine Luiza, das estratégias de mercado adotadas pela empresa e muitas citações a sua presidente. Comecei a me interessar demais por sua trajetória e li muita coisa a seu respeito. Mas a "Lu" ganhou minha admiração quando ela esculachou com aqueles jornalistas coxinhas do "Manhattan Connection", principalmente com o Diogo Mainardi, ao explicar, com dados e mais dados, o varejo para a classe C. Em suma, ela deu uma aula de economia e deixou o cara sem fala. O link é este aqui e divirta-se, pois vale muito a pena! https://www.youtube.com/watch?v=WCTkwB2BcwY
Fechando parêntese.]

Voltando ao livro, o que me chamou a atenção nessa leitura inicial foi algo um tanto recorrente no mercado editorial brasileiro: a intocabilidade de alguns textos.

O prefácio de Luiza é claro, simples e objetivo. Dá para perceber que ela colheu informações a respeito da autora Sheryl Sandberg [afinal, ela é uma das pessoas mais poderosas da maior rede social do mundo] e [principalmente] que o texto é de sua autoria. Entretanto, aí é que reside o problema.

Como dois mais dois são quatro, a Lu é uma pessoa ocupadíssima. Isso é fato. E, muito provavelmente, enquanto a edição estava sendo preparada, o texto da Luiza ainda não havia sido entregue. Algo muito comum no mundo editorial. E outra coisa muito comum nessa área é a tal "intocabilidade" que mencionei acima.

Quando alguém é perito em sua área, seja ela qual for, este é respeitadíssimo, claro. É o caso da Luiza [Lu, te adoro!]. Porém, existe essa "tarefa", se é que posso chamar assim essa característica, de as editoras brasileiras não darem lá muita atenção aos textos dessas "autoridades". Dois exemplos do prefácio: "encarregada de sessão" [no lugar de seção, departamento] e "expectadora" [no sentido de ver, assistir]. Não estou criticando e apontando os desvios ortográficos da escrita de Luiza porque desvios desse tipo são extremamente comuns – pois todos nós tropeçamos nessa nossa língua dificílima – e também não critico meus colegas revisores deste livro, pois é bem provável que esta parte do prefácio não tenha passado por eles. Algo parecido já aconteceu com um livro que revisei há alguns meses: no meio do processo de edição, a tradutora da obra nos entregou de última hora sua introdução e nos foi alertado de que não "mexeríamos" em seu texto porque ela é respeitadíssima no meio. Demos uma olhadela básica e estava tudo bem. Porém, na edição impressa, o texto introdutório dela saiu com um trecho repetido de um parágrafo. Nos indagamos como isso aconteceu, pois estava tudo certo [apesar de não termos concordado em deixar o texto da tradutora do jeito que ele saiu] e sabe-se lá como o famigerado trecho se repetiu. Quando o assunto é texto, tudo é possível. Possivelmente, a mesma coisa deve ter ocorrido no processo de edição de Faça acontecer. Provavelmente alguém disse para a equipe que não "mexesse" [a.k.a. revisar] no texto da Luiza, já que ela é "uma autoridade no assunto, porque os editores lidam com egos dos autores e blá-blá-blá". Porém, o "saci" pula aos olhos do leitor mais atento [não digo isto como revisora], e quem leva a culpa é, claro, o revisor, depois o editor, a editora e, inclusive, a Lu [que não tem obrigação nenhuma de ser uma sumidade na modalidade escrita da língua portuguesa].

Utilizo, agora, dois jargões muito comuns na área corporativa que ilustram bem esses casos: é preciso ter comprometimento [das empresas] e muita, muita resiliência [dos profissionais envolvidos na produção do livro].

Mas não vejo a hora de continuar a leitura na volta para casa! E um dia eu quero ser como a Lu!

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