sexta-feira, 27 de julho de 2012

Você emite nota?

Nos últimos dias, eu venho me sentindo muito ofendida.

Estou em busca de recolocação profissional, que seja, no mínimo, decente. Nada demais. Não quero multinacionais da área editorial, nem cargos bárbaros e nem quero algo totalmente fantástico que sugue a vida pessoal. Nada disso. Eu quero somente algo digno – e, diante das "propostas" que vêm aparecendo nas últimas semanas, praticamente nada é minimamente decente.

Fico horrorizada com tamanha terceirização do setor. Tudo tem de emitir nota, tem de ser PJ, pois, de outra forma, não rola. Fico ainda mais horrorizada quando empresas entram em contato comigo me oferecendo uma vaga aparentemente bacana, porém eu teria de emitir nota fiscal e, além disso, teria de trabalhar num regime de "freela fixo". "Freela fixo"? Que p@#$% é essa? É uma pergunta retórica, claro que sei sobre o famigerado "freela fixo"!

Um freela fixo seria nada mais do que um profissional exercendo sua função num local, cumprindo horários e  exigências como qualquer outro funcionário de regime CLT. Porém, ele não recebe qualquer tipo de benefício, seja lá um vale-transporte para pegar o busão. Legal, né?! Como diria um amigo meu que é advogado, "isso dá um processo trabalhista espetacular". Contudo, diante da disseminação dessa relação "trabalhista" e com tanta gente inclusive preferindo essa modalidade de trabalho, como faz? Difícil acontecer alguma coisa. Ninguém quer mexer com peixe grande, dependendo da grandeza do peixe.

Só nesta semana duas empresas me ligaram oferecendo esse tipo de prestação de serviço. Confesso que fiquei interessada por uma das propostas. Mas, só de pensar que eu teria de correr atrás desses esquemas de CNPJ, nota fiscal e das burocracias advindas disso me dá preguiça e medo. Medo de não conseguir lidar com esse tipo de coisa e me prejudicar. Diante das coisas que estão acontecendo comigo, eu não poderia ficar recusando muita coisa, não. Por sorte eu consegui uma bolsa de mestrado da Capes – o que não é lá aquela coisa –, logo, quero algo para complementar a renda. Claro que faço muitos freelas, mas freela, para mim, significa prestar o serviço da sua casa, da padaria da esquina, do café do rua. Não essa palhaçada de ser um funcionário de mentirinha.

Além das piadas propostas, as empresas com regime CLT também têm seus "babados". Nesta mesma semana, fiquei sabendo, graças a colegas de grupos de e-mail sobre a profissão e o mercado editorial, que a empresa para a qual eu faria um teste/entrevista explora seus funcionários da maneira mais descarada: horas extras quase todos os dias e sem remuneração, banco de horas que nunca pode ser utilizado (ora, se todo dia tem hora extra, como a pessoa pode usar o banco de horas, não é mesmo?), baixo salário e sem perspectiva de crescimento. Desisti na hora. Diante da opinião unânime de três pessoas que lá trabalharam, não quis entrar numa enrascada.

Há umas duas semanas fui chamada para trabalhar numa editora. Parecia ser um lugar agradável e com pessoas cordiais. Até aí, tudo bem. O problema é que trabalhar em empresa familiar e de pequeno porte não há muita perspectiva de crescimento. Além disso, não tenho nenhuma familiaridade com a temática das obras de lá; nada contra quem gosta, até estava disposta a aprender coisas do gênero para me familiarizar. No dia em que eu iria começar na editora, eu fui assinar o termo de concessão da bolsa Capes. Achei que foi a melhor decisão por hora.

Mesmo tendo a bolsa, eu não desisti da busca pela minha realização profissional. Não tenho problema nenhum em abrir mão da bolsa, caso encontrar algo bacana. Afinal, como disse, coisas pelas quais estava esperando logo acontecerão (e tenho fé disso). Não acho justo estudar e não poder trabalhar com registro em carteira. Os órgãos de fomento ainda não entendem a realidade dos estudantes de pós-graduação do país. Há alunos que já são casados, com filhos e com contas a pagar. Somente a bolsa não é viável, ainda mais numa cidade caríssima como São Paulo. O que acho justo é procurar e encontrar um lugar que tenha uma proposta, no mínimo, decente. Eu estudo (e muito) para alcançar esse objetivo. Só que está complicado. Tem horas em que "a mina pira".

Acredito que todo mundo tem o direito de trabalhar decentemente, num lugar decente e com os todos os direitos previstos em lei. Será que terei de ficar lutando contra a maré da terceirização até encontrar algo com renda fixa? Será que estou pedindo demais? Será que terei de ficar ouvindo exaustivamente "Você emite nota?".

2 comentários:

  1. Mais tarde comento mais, mas uma informação útil demais: minha namorada teve câncer, e essa era um dos poucos motivos aceitos para poder fazer a retirada antecipada do FGTS para poder fazer o tratamento. Se ela fosse PJ, a "empresa" poderia simplesmente cancelar o contrato e fim, mas felizmente ela está CLT e pôde fazer a retirada do FGTS e ficar de licença remunerada durante o tratamento.

    Acho um absurdo sem tamanho, pois é para fazer esse tipo de coisa(desovar o funcionário quando for conveniente) que essas empresas querem empurrar o PJ

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  2. Pois é, Alex, justamente para esse tipo de coisa que tenho receio de entrar nesse esquema de PJ. Sendo as empresas sacanas ou não, as que registram o profissional em regime CLT têm a obrigação de cumprir com as regras dele. Logo, a vantagem de poder desfrutar dos benefícios previstos em lei, como foi o caso da tua namorada. E como aconteceu comigo quando fui demitida sem justa causa da última editora: estou segurando a onda com essa grana de FGTS enquanto procuro uma nova oportunidade.E é um absurdo sem tamanho esse tipo de coisa.
    E, nossa, que barra que ela deve ter passado! Depois conte pessoalmente isso aí.

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